Caminhei por horas, talvez dias — era impossível dizer.
O tempo não seguia mais as regras do mundo conhecido.
Tudo que guiava meus passos era a lembrança. A lembrança dela.
As passagens eram estreitas, fétidas e úmidas, como se o próprio ar estivesse em decomposição. As paredes da caverna choravam musgo e lama. O silêncio era denso, quebrado apenas pelo som dos meus pés vencendo o chão encharcado.
E então, a escuridão cedeu. Uma pálida luz brotou no horizonte de pedra, anunciando a chegada a uma clareira subterrânea. Era como se aquele espaço fosse sagrado, separado do resto do mundo por véus invisíveis.
No centro, à beira de um lago de águas quietas e negras, estava ele.
Um velho. Curvado como um carvalho ancestral. Apoiado num cajado de madeira retorcida, onde se firmava o crânio de uma criatura com chifres longos e quebrados. Seus cabelos brancos desciam em cascata sobre os ombros, misturando-se aos trapos que vestia. Sua pele era pálida, enrugada, quase translúcida — como se tivesse testemunhado a própria criação de Tandanun.
Diante dele, uma fumaça densa e bruxuleante nascia do lago. Serpenteava por entre as pedras, sumindo na penumbra como se desenhasse histórias esquecidas. Ela parecia viva. E, por um momento, vi um pequeno laço feito de névoa brincar no ar como uma criança inocente.
— Entre, jovem. — disse o velho, sem se virar, sem parar de contemplar a fumaça.
Eu hesitei. Como ele sabia que eu estava ali? Não fiz ruído algum.
— Por que está surpreso? — continuou — Tudo eu conheço.
Todos que chegam até mim desejam uma coisa: poder. Riqueza. Vingança.
Mas você... você quer algo muito mais antigo. Algo que não se compra nem se conquista:
Você quer o amor perdido.
Seu olhar então encontrou o meu. Era como se mil vidas me encarassem de uma vez.
— Sente-se ao meu lado. Olhe para o lago.
Obedeci. Sentei em silêncio. E ali, naquele instante, me senti fora do tempo. Fora da matéria. Como se minha alma fosse mais leve do que o corpo.
— Olhe bem... — sussurrou ele, apontando com os olhos.
No centro do lago, um redemoinho formava-se suavemente. No meio dele, uma luz fraca pulsava.
E então, vi.
Seus olhos. Seu sorriso. Seus cabelos movendo-se como se dançassem ao vento.
Ela estava ali.
Meu amor. Aquela que a guerra levou. A que nenhuma magia ou deus conseguiu devolver. Mas ali, naquele instante suspenso entre mundos, entre o real e o etéreo... Eu a via. Sentia.
E sem dizer palavra, entendi.
Ali eu ficaria.
Ao lado dela.
Ao lado do que restou de mim.
Ao lado do velho que me mostrou que o amor verdadeiro não morre... apenas adormece onde a alma ousa procurar.
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Muito obrigado por ler até aqui.
Até a próxima Crônica de Tandanun!
🌍 Tandanun está mudando!
Em breve, novidades!
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